(...)
Segunda: Os estudantes do seminário me deram de presente um kindle. Para que atualize seu modo de ler, professor, ironizam. Incluíram as obras completas de Rosa Luxemburgo e de Henry James. Passo várias horas estudando as múltiplas possibilidades do aparelho digital. Uma máquina de ler mais dinâmica que um livro (e mais fria).
Lemos igual, apesar da mudança? O que persiste nesta prática de larguíssima duração? Tendo a pensar que o modo de ler não variou, para além das mudanças no suporte – papiro, rolo, livro, tela-, da posição do corpo, dos sistemas de iluminação e das mudanças na diagramação dos textos. Ler sempre foi ir de um signo para outro. O movimento, assim como a respiração, não variou. Lemos à mesma velocidade que nos tempos de Aristóteles.
Quando dizemos que uma imagem vale mais que mil palavras, queremos dizer que a imagem vem mais rápido, a captação é instantânea, enquanto ler um texto de mil palavras, qualquer um, requer outro tempo, uma pausa.
A linguagem tem sua própria temporalidade; (...) Para estar à altura da velocidade de circulação das novas tecnologias, seria preciso abandonar as palavras e passar a uma linguagem inventada, feita de números e anotações matemáticas.
Então sim, quem sabe estaríamos à altura das máquinas rápidas. Mas é impossível substituir a linguagem, todo esperanto é cômico. O sistema de abreviações taquigráficas do Twitter e das mensagens de texto acelera a escrita, mas não o tempo de leitura; é preciso repor as letras que faltam – e reconstruir uma triste sintaxe- para compreender o sentido.
(...)
(Folha de São Paulo; Ilustríssima – Literatura. Domingo,26/06/2011
Nenhum comentário:
Postar um comentário